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“O futuro é de quem entender o tempo em que está vivendo”

“O futuro é de quem entender o tempo em que está vivendo”

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Foi no século XIX que o vocábulo “geração” começou a circular em rodas intelectuais voltadas a desvendar as mudanças na sociedade. O professor e palestrante Dado Schneider, mestre e doutor em Comunicação pela PUC/RS, foi um dos que se debruçou sobre o tema e hoje é referência quando o assunto é geração Z. 

Embora reconheça a importância da divisão da população pela idade, ele faz ressalvas ao critério etário. “No século XX jovem era jovem e velho era velho, com honrosas exceções, a gente se diferenciava por idades. O século XXI tem jovem/jovem, jovem/velho, velho/velho e velho/jovem. O futuro é de quem entender o tempo em que está vivendo e estiver aberto a se atualizar”, pondera.

Schneider, conhecido ainda como criador da marca Claro e “evangelista digital” do Magalu em sua Virada Digital, é um dos palestrantes do Tedx Maringá, que acontecerá em 10 de junho no Teatro Calil Haddad:

 

Gerações X, Y, Z, Alfa e Baby Boomers. Afinal, como surgiram as gerações? 

Essa classificação foi feita pelas agências de propaganda americanas no pós-guerra. Ela não é conclusiva, mas ajuda a se situar em épocas. A geração mais velha hoje no mercado de trabalho é a Baby Boomers, dos nascidos de 1945 ao início da década de 60. É chamada assim por causa do represamento de nascimentos durante a Segunda Guerra Mundial. Quando terminou a guerra, houve explosão de nascimentos, um baby boom, daí o nome. A geração anterior era chamada de silenciosa, porque não tinha voz. O jovem era apenas um adulto mais novo. Se vestia e se comportava como adulto, e até fumava para parecer adulto. Os babies boomers foram criados mais soltos e quando cresceram viraram hippies. Eles foram a primeira geração verdadeiramente jovem. Aí veio a incógnita de como seria a próxima geração, e esta incógnita virou um X. Por isso a geração pós Baby Boomer se tornou a geração X, que vem de 1962, 1963 aos anos 80. Estas duas gerações são parecidas porque tiveram a mesma criação. Faziam fila para entrar em sala de aula, cantavam hino nacional, apanharam dos pais. Em relação ao mercado de trabalho, hoje tem mais pessoas da geração X no comando do que Baby Boomer. Depois da X, por ordem alfabética, vem a Y, que são os nascidos entre 1981 e 1999 aproximadamente, os chamados millenials. Os jovens hoje são a geração Z, nascida entre o final do século passado até cerca de 2012. Depois ainda tem a geração Alpha, que considero como marco do smartphone. Os pais da geração Z ainda falavam com os filhos pequenos, empurravam o carrinho na rua sem olhar para o celular, enquanto a geração Alpha é criada com os pais de olhos nas telas. E agora está nascendo a geração Beta. 

 

De que forma a evolução digital tem influenciado estas gerações? 

Um grande marco na história da humanidade é a internet. E a geração Z veio a bordo da internet. Os millenials foram os últimos que brincaram na rua, andaram de bicicleta, jogaram futebol. Os mais jovens desta geração até começaram a jogar game e ficar mais dentro de casa. Logo, há uma diferença brutal de infância entre Z e millenials. Enquanto a Z veio a bordo da internet, a Alpha é do smartphone e a Beta da inteligência artificial. Já os babies boomers vieram a bordo da TV. E antes disso era a geração do rádio. 

 

Quais gerações estão presentes no mercado de trabalho? 

Há honrosas exceções da geração silenciosa, gente com mais de 80 anos que ainda trabalha e comanda empresas. Também já são poucos os babies boomers. Aqueles que conseguiram se aposentar e guardar algum dinheiro estão parando. Os babies boomers das classes menos favorecidas ainda estão na ativa. Quem está trabalhando a pleno vapor é a geração X. Já os millenials estão mais parecidos com os mais velhos, estressados e atarefados. Os Z não são mais novidades, embora só agora estejam sendo descobertos por alguns setores da mídia. Eles estão no mercado há cerca de cinco anos, pelo menos estagiando, e tiveram o azar de iniciar no mercado de trabalho em plena pandemia, no confinamento. E, por fim, temos menores aprendizes da Alpha. 

 

Este início durante a pandemia influenciou o perfil deles? 

A geração Z é feita de outro material. Eles não lidam com autoridade como os outros. As gerações X e Y olhavam para a autoridade de baixo para cima, dentro de casa, na sala de aula e no ambiente profissional. Elas temeram e temem a autoridade. Durante muito tempo as relações aconteciam num mundo vertical, onde uma geração mandava na outra. A geração Z chegou com o mundo na posição horizontal, criada pela internet. Isso porque a internet possibilitou infinitas fontes de informação e passamos a aprender com os mais novos. Por isso a geração Z é a primeira a não olhar a autoridade debaixo para cima. Ao entrar no mercado de trabalho, eles não suportam um chefe que bate na mesa cobrando relatórios porque até agora ninguém os tratou desta forma. 

 

O que a geração Z busca no mercado de trabalho? 

Eles não vieram ao mundo para ter coisas. Vieram para ter experiências. Raramente falam a palavra trabalho, usam a palavra trampo. Trabalho dá a ideia de continuidade, de subir na vida, de galgar postos, como se a sequência da vida fosse escalar uma montanha. Não querem fazer carreira, com raras exceções. 

 

Qual a solução para as empresas que precisam contratar? 

No curto prazo, é contratar profissionais maduros e treinar as habilidades necessárias para atualizá-los. As pessoas 40+ já estão desatualizadas, as 50+ estão ainda mais e as 60+ são quase sem solução. Entretanto, uma pessoa de 45 anos, que talvez já esteja na descendente no mercado de trabalho, vai agarrar com unhas e dentes a oportunidade, principalmente porque ela é da geração da segurança, preocupada em ter plano de saúde. Se for um velho com vontade de aprender, talvez tenha mais espaço profissional no futuro do que um jovem conservador que acha que já sabe tudo. A Martha Gabriel, uma amiga que escreve sobre tecnologia, tem uma frase genial: você não vai perder o emprego para inteligência artificial. Você pode perder o seu espaço para alguém que lide melhor com a inteligência artificial, e este alguém pode ser mais velho do que você.

 

E como lidar com este encontro de gerações no trabalho?

Estamos diante de jovens com uma necessidade de impor verdades, comportamentos e regras. Quem terá que iniciar o diálogo de aproximação entre as gerações são os mais vividos. Os jovens não sabem nem têm interesse pela história. Eles acham que estão reinventando tudo, que nada foi feito antes deles surgirem, acham que são o centro do universo. Por outro lado, há algum tempo eles estão nos dando um recado importante: não querem ser como nós. Não somos exemplos de conduta profissional porque estamos sempre estressados, sem tempo para os mais jovens. A geração Z foi criada em ambientes que trabalho é um fardo. Devíamos ter uma vida mais saudável só que naturalizamos virar a noite trabalhando ou uma mulher ter que amamentar no meio do expediente. 

 

O consumo também tem sido muito impactado por este novo jeito de viver da geração Z? 

Eles compartilham de informação a mágoas, tristezas a beijos. Imagina se não vão compartilhar roupas, carros e casas. Estamos vivendo uma revolução de consumo. Esta geração está enlouquecendo os profissionais de marketing. Marcas icônicas das gerações millennials e X, a exemplo de Apple e Nike, estão sendo trocadas por marcas de fundo de quintal que surgem e roubam a cena por causa da sua pegada de sustentabilidade, por exemplo. 

 

E qual será o futuro da comunicação? 

Será apenas oral. Adeus à escrita. Acho que é uma involução neste ponto porque o vocabulário é cada vez mais diminuto. Há menos clareza na comunicação porque não tem vírgula, não tem ponto, não tem construção frasal correta. Abre-se aí espaço para os mais velhos. Dizem que a inteligência artificial depende de uma melhor construção de comando e quem tem mais repertório para construir melhores prompts são os mais velhos. 

 

De forma geral, você é otimista em relação ao futuro? 

Sou. Estamos na adolescência do futuro e amadureceremos como sociedade no prazo de 10 a 15 anos.