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O meio ambiente pede licença

O meio ambiente pede licença

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A engenheira química Isabela Menegassi começou a desenvolver cosméticos por prazer, para uso individual, os amigos ficaram sabendo, começaram a comprar e a disseminar os produtos, entre sabonetes, hidratantes, xampu e condicionador. Com a ampliação do portfólio e a possibilidade de expandir o público veio a necessidade de regularizar a produção. “Muitas pessoas pediam para colocar os produtos em suas lojas, mas tínhamos que nos regularizar, termos todas as licenças. Chegou um momento em que não víamos outro caminho para crescer que não fosse ter uma empresa”, conta a proprietária da Tropicália Cosméticos Naturais.

Como a obtenção de licenças leva alguns meses, Isabela teve de terceirizar a produção para continuar no mercado. “Antes da regularização, tínhamos 21 produtos, mas como a licença é individual, atualmente temos seis licenciados e regularizados junto à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa)”, explica.

O sonho é voltar a ter produção própria, mas como o investimento é grande e leva tempo, a empresa segue só com a distribuição e com a parte de inovação até recuperar o fôlego. “Para regularizar um produto leva-se, em média, três meses. Não podíamos ficar parados. Para regularizar nosso espaço foram mais quatro meses, então, precisamos deste tempo para nos organizar e, quem sabe, num futuro próximo, termos nossa própria indústria, regularizada e com todas as licenças necessárias”.

Inicialmente para uso próprio, os produtos de higiene pessoal fabricados por Isabela Menegassi deram origem à Tropicália Produtos Naturais; ela está regularizando a produção

Desburocratização de processos

A legislação diz que qualquer empresa que possa impactar negativamente a natureza ou a população precisa de licenças ambientais e junto à Anvisa, com regras e deveres a serem cumpridos.

Para o vice-presidente para assuntos de meio ambiente da ACIM, Marcelo Felix Frade, que é consultor no assunto e proprietário da Ingá Ecológica, a busca pelo licenciamento é primordial. “Ele é necessário para o crescimento consciente e seguro tanto para o empreendedor quanto para a sociedade e o meio ambiente. O licenciamento é uma forma do poder público defender e preservar o meio ambiente, minimizando os impactos ambientais, e os órgãos licenciados dão o caminho para que isso ocorra”.

O grande esforço, atualmente, é desburocratizar o processo na busca pelas licenças e regularizações. “É inviável para um pequeno empresário, que está no início, ficar quatro meses ou mais aguardando uma licença. Tem licença que demora mais de um ano para sair”. 

Para agilizar o processo, há uma discussão no Senado Federal: em maio um projeto de lei que altera procedimentos para o licenciamento ambiental no país foi aprovado pela Câmara e começou a ser analisado pelo Senado. O objetivo é simplificar e agilizar processos. “Sou favorável a essas mudanças. A demora acaba penalizando o empreendedor que está aguardando para iniciar um negócio. No entanto, o projeto deve ser amplamente discutido”. 

Frade detalha que está sendo proposto um novo modelo, o de Licenciamento por Adesão e Compromisso (LAC), uma espécie de autolicenciamento. O empreendedor emite via internet a licença, comprometendo-se a cumprir a legislação ambiental. “Em São Paulo esse tipo de modalidade existe para empreendimentos de baixo impacto. No Paraná foi instituído pela Resolução do Conselho Estadual de Meio Ambiente nº 107, de 2020, mas ainda deve ser incluído no Sistema de Gestão Ambiental (SGA) do estado para que a solicitação possa ser feita”.


Marcelo Felix Frade, da Ingá Ecológica: “é inviável para um pequeno empresário, que está no início, ficar quatro meses ou mais aguardando uma licença”

Conformidade gera benefícios

Obter uma licença, mais do que trabalhar com segurança, é demonstrar ao consumidor o compromisso com o meio em que está operando. Obrigações seguidas à risca conferem valor ao produto desenvolvido.

Para a consultora do Sebrae/PR, Rosineide Pereira, a formalização e o registro geram oportunidade e ganhos para o negócio. “Estar em conformidade com as leis federais, estaduais e municipais geram mais parcerias, acesso a linhas de crédito, oportunidade de exportação e também de receber subsídios do governo”. 

A informalidade, segundo a consultora, é um risco que pode gerar transtornos. “Muitas vezes até por desconhecimento, micro e pequenas empresas acabam negligenciando a normalização em seus empreendimentos. Isso pode gerar prejuízos ou até colocar o funcionamento em risco”, ressalta Rosineide. 

O descumprimento também impede a competitividade e a busca pela excelência, impedindo a certificação ou a atribuição de selos de qualidade. “E isso não depende do tamanho do empreendimento, seja no setor industrial, de comércio ou de serviços. O cumprimento das normas torna as rotinas das empresas mais seguras, estabelece condições para competição, facilita a implementação de tecnologias, estimula a inovação, entre outros benefícios. Além de se tornar referencial para o mercado, tornam-se mais competitivas e fortes”, defende.


Rosineide Pereira, do Sebrae: “o cumprimento das normas torna as rotinas das empresas mais seguras, estabelece condições para competição, estimula a inovação, entre outros benefícios”

Passo a passo

Para quem precisa ou quer se regularizar, o caminho é, inicialmente, se informar sobre qual o órgão ambiental deve pedir a licença: Secretaria Municipal de Meio Ambiente ou o Instituto Água e Terra (IAT) - antigo IAP.

“Em seguida é necessário solicitar ao município uma carta de anuência de uso e ocupação do solo, ou seja, informar que a atividade está de acordo com o plano diretor da localidade. Tendo isso em mãos, começa-se o processo”, explica Felix.

Outra dica do consultor é fazer uma visita à Secretaria de Meio Ambiente ou IAT para coletar informações e avaliar se será preciso a contratação de um profissional para realizar o processo de licenciamento. O custo desse processo é variável. Para o IAT a taxa leva em consideração a área ocupada, número de colaboradores, fase da licença e investimento. O próprio sistema calcular o valor, conforme as informações preenchidas.

Novo local

Há 12 anos funcionando em Maringá, a Alfazema Manipulação passou recentemente por mais um processo de obtenção de licenças e regularização por conta da mudança de endereço. Uma nova licença foi necessária e o processo foi o mesmo. “Precisamos da aprovação do projeto arquitetônico, no papel. Quando aprovado pela Vigilância Sanitária local, enviamos o memorial descritivo que passou por análise, para daí iniciarmos a obra”, conta a farmacêutica Fernanda Biava Vera, proprietária da empresa. Com a obra concluída foi preciso uma nova vistoria para a obtenção do alvará sanitária como farmácia de manipulação.

Com dez funcionários, a empresa atua na manipulação de fórmulas, medicamentos fitoterápicos para a saúde e para a beleza. Também trabalha com a revenda de produtos. Fernanda acrescenta que dependendo do produto manipulado é necessária uma licença específica. “Para hormônio de uso oral ou antibiótico, por exemplo, será preciso uma autorização diferente”.

São controles de qualidade rígidos, mas necessários para manter a qualidade dos produtos. “Periodicamente enviamos nossos produtos para um laboratório de controle de qualidade, em Curitiba, e precisamos manter tudo isso documentado. Temos um farmacêutico full time, pois algumas entregas só podem ser feitas por ele. Também temos uma empresa específica que faz a coleta dos resíduos (produtos vencidos, fórmulas não-retiradas) para garantir a destinação correta”. O meio ambiente agradece.


Antes da Alfazema Manipulação mudar de endereço, Fernanda Biava Vera aprovou o projeto na Vigilância Sanitária; depois que a obra foi concluída foi preciso uma vistoria do órgão

Etapas para o licenciamento ambiental na abertura de empresa:

Licença Prévia (LP): Necessária na fase de planejamento. Analisa a viabilidade ambiental da localização do empreendimento e traz condicionantes que devem ser atendidas para a próxima fase.

Licença de Instalação (LI): Autoriza o início da implantação (construção) do empreendimento conforme as especificações dos projetos aprovados na fase anterior, trazendo em suas condicionantes parâmetros, procedimentos e ações que devem ser seguidos e podem ser submetidos à fiscalização ambiental e necessários para que a próxima etapa do licenciamento ambiental seja alcançada.

Licença de Operação (LO): Aprova o funcionamento do empreendimento, após a verificação do cumprimento de todas as condicionantes ambientais estabelecidas nas etapas anteriores, e determina novas medidas de controle ambiental e normas estabelecidas que devem ser atendidas durante sua operação.

Quem precisa de Licenciamento Ambiental?

Todo empreendimento ou atividade que pode causar impacto ambiental. O tipo de licença vai depender do porte, potencial poluidor, risco ambiental e natureza da atividade